Thursday, June 29, 2006

Apresentação:

[..."Homem 2- Sou um homem doente...um homem mau, antipático, sofro do fígado. Nem sequer sei ao certo onde me dói. Não me trato nem nunca me tratei. Sou bastante instruído: não devia, portanto, ser supersticioso, mas sou. Muito supersticioso. (...) Não! Se não me trato é por pura maldade. Não vos posso explicar a quem faço mal; sei muito bem que não são os médicos quem eu incomodo quando recuso tratar-me. Só me faço mal a mim próprio; e sei isso. E, no entanto, é mesmo por maldade que não me trato. Dói-me o fígado! Ainda bem! Quanto mais me doer melhor! Já há muito tempo que vivo assim: mais ou menos vinte anos. Tenho quarenta. (...) Aquilo que acima de tudo fazia crescer a minha raiva, aquilo que a tornava realmente vil e estúpida, sabem o que era? É que eu percebia sempre, cheio de vergonha, mesmo nos momentos em que a minha bílis mais violentamente extravasava, que, no fundo, não sou um homem mau, nem sequer azedo, e que pura e simplesmente me dava gozo espantar pardais. Tenho a boca a espumar; mas tragam-me um brinquedo, ofereçam-me uma chávena de chá, e é provável que eu me acalme, que fique até cheio de ternura. Depois, roo as unhas e, cheio de vergonha, perco o sono durante meses. Sou assim mesmo. Nunca consegui tornar-me realmente mau. De facto, verificava sempre que em mim havia uma grande diversidade de elementos sempre opostos. Sentia-os fervilhar cá dentro, por assim dizer. Sabia que estavam sempre presentes e que queriam vir cá para fora, mas eu não os deixava; não, não deixava que saíssem...Atormentavam-me até eu ficar cheio de vergonha, até me fazerem cair em convulsões. Ficava tão cansado! Farto!" ...]

Adaptação de quem entre nós adaptou Dostoievski...